Só há uma maneira de salvar o casamento: baixar as expectativas
Demorei a descobrir por que meu avô considerava "pouca vergonha" pessoas separadas conversarem ou até se cumprimentarem. Quem viveu na primeira metade do século 20 não podia mesmo entender. Na maioria dos países ocidentais, o casamento constituía um contrato duradouro e não era permitido o rompimento, a não ser em casos de faltas gravíssimas cometidas por um dos cônjuges. Entre elas estavam o abandono do lar, adultério, alcoolismo e violência física. "Depois de tanto ultraje, como podem ficar amigos?", ele devia se perguntar.
Naquela época não havia separações amigáveis. Embora, como acontece hoje, as mulheres fossem responsáveis pela maioria dos pedidos de separação, a situação delas era bem difícil. Apesar de só se separar quando o casamento se tornava insuportável, elas eram discriminadas e representavam uma vergonha para a família.
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Para salvar o casamento, chegaram a adotar soluções tragicômicas, como a de 1929, em Cleveland, nos Estados Unidos. É inacreditável, mas pretenderam resolver o problema fazendo do bridge matéria obrigatória nas escolas municipais. Diziam que o lar americano se encontrava em decadência porque nele quase não se jogava o bridge. E que muitos casamentos se desfizeram porque o casal, em vez de jogar bridge entre si, passou a sair, cada um para o seu lado. Ao ensinar o jogo às crianças, estariam preparando-as para uma vida conjugal sólida.
A felicidade no casamento depende das expectativas que se depositam na vida a dois. Antigamente as opções de atividades fora do convívio familiar eram bastante limitadas, não só para as mulheres que cuidavam da casa e dos filhos, como para os homens que do trabalho iam direto para o aconchego do lar. Desconhecendo outras possibilidades de vida, não almejavam nada diferente. Havia um conformismo generalizado.
Entretanto, o movimento de emancipação feminina e a liberação sexual dos anos 60 trouxeram mudanças profundas na expectativa de permanência de uma relação conjugal. Surgiram muitas opções de lazer, de desenvolver interesses vários, de conhecer outras pessoas e outros lugares.
Sem falar numa maior permissividade social para novas experimentações, nunca ousadas anteriormente. Ao contrário da época em que, excetuando os casos de intenso sofrimento, ninguém se separava, hoje a duração dos casamentos é cada vez menor. Isso ocorre porque, quando uma pessoa se vê privada das perspectivas que são de, alguma forma, possíveis, a frustração é inegável.
Que o casamento está em crise não é novidade nenhuma. E isso começou a acontecer depois que o cônjuge passou a ser escolhido por amor e não mais por interesses familiares. As perspectivas não são nada animadoras e talvez só tenha um jeito. Para ser sólido e duradouro, o casamento precisa voltar a ser como sempre foi: sem nenhuma expectativa de romance ou de prazer sexual. Será que alguém se habilita?
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