Mesmo desnecessário, casamento pode ser ótimo. É só reformular expectativas
Ilustração: Caio Borges/UOL
A vida a dois numa relação estável fechada, como o modelo de casamento que aprendemos a desejar, torna-se cada vez mais difícil de suportar diante das transformações e apelos da sociedade atual. A família não é mais necessária para a sobrevivência da espécie nem o casamento é um vínculo divino, uma aliança entre duas famílias ou uma união econômica, que durante tanto tempo justificaram a sua existência.
O que ele proporciona hoje é um modo de vida repressivo e insatisfatório. Muitos discordam dessa ideia alegando que o casamento deve ser conservado por causa da felicidade que pode proporcionar. Mas o problema não consiste em saber se o casamento encerra uma potencialidade de felicidade, mas sim se a realiza. Não, para a maioria não realiza, e todos sabem disso.
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Freud dizia existirem duas formas de o ser humano buscar a felicidade: visando a evitar a dor e o desprazer ou a experimentar fortes sensações de prazer. Na nossa cultura, em que o sofrimento é visto como virtude, não é de se estranhar que a grande maioria das pessoas não ouse tentar viver de uma forma realmente prazerosa. A submissão aos padrões sociais estabelecidos é aceita, para evitar o desprazer da tensão empregada na construção de uma existência autônoma.
Num processo de crescimento emocional, é necessário se aprender a lidar com a falta, o desamparo inevitável da condição humana e, percebendo as próprias singularidades, buscar uma convivência harmônica consigo próprio. Para muitos parece uma meta impossível. Estimulados pelas promessas equivocadas do amor romântico, depositam na relação com o outro todas as expectativas de proteção e segurança afetiva.
Acredito que um casamento, apesar de não ser mais necessário, pode ser ótimo. Mas para isso as pessoas precisam reformular as expectativas que alimentam a respeito da vida a dois, como, por exemplo, a ideia de que os dois vão se transformar num só; a crença de que um terá todas as suas necessidades atendidas pelo outro; não poder ter nenhum interesse em que o amado não faça parte.
É fundamental que haja respeito total ao outro, ao seu jeito de ser e de pensar, às suas escolhas; liberdade de ir e vir, ter amigos em separado e programas independentes e, o mais importante, não haver controle algum da vida do outro. Caso contrário, a maioria das relações, com o tempo, se torna sufocante.
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