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Regina Navarro Lins

O orgulho do machão

Regina Navarro Lins

21/12/2013 09h01

Ilustração: Lumi Mae

Ilustração: Lumi Mae

Comentando o "Se eu fosse você"

A questão da semana é o caso do internauta que é criticado pela namorada por se vangloriar do tamanho do seu pênis.

"Se pedíssemos a alguém para dizer qual a coisa mais importante do mundo, em toda sua história, a resposta com certeza seria: o pênis". Li essa afirmação, há muito tempo, em algum livro, e me lembrei dela quando ouvi o relato do internauta. E o autor continuava fazendo considerações sobre o órgão sexual masculino.

Dizia que um homem pode perfeitamente não se lembrar da forma ou do jeito do seu braço. Pode esquecer um ferimento no rosto, mas nunca esquecerá a forma do seu pênis. Presta-lhe mais atenção do que a qualquer outra coisa. Dedica-lhe mais afagos e zelo do que a qualquer outra parte do corpo. Protege-o acima de tudo.

Além disso, é gratificante a todo homem poder se orgulhar do seu pênis — seu tamanho, forma, qualidade e desempenho. Tudo o que corrói esse orgulho corrói o próprio homem. Para ele, o pênis é de suprema importância. Nada que o afeta deixa de afetar o homem na mesma proporção, e vice-versa. E o texto concluía afirmando que se gostando ou não dessa ideia, o homem 'é' o seu pênis. Entretanto, não foi sempre assim.

Durante milênios, a participação do homem na procriação foi ignorada. A fertilidade era considerada característica exclusivamente feminina. Acreditava-se que a vida pré-natal das crianças começava nas águas, nas pedras, nas árvores ou nas grutas, antes de serem introduzidas por um sopro no ventre de sua mãe humana.

Mas quando o homem começou a domesticar os animais, percebeu, surpreso, que para a procriação é necessário o sêmen do macho. A partir daí houve uma ruptura na história da humanidade. O homem, enfim, descobriu seu papel imprescindível num terreno onde sua potência havia sido negada.

Nessa época, há mais ou menos cinco mil anos, a fertilidade era tudo, e a fertilidade humana e a dos campos estavam estreitamente ligadas. E o homem se vê transformado em fertilizador da terra. Afirmando que era seu sêmen que implantava a vida no útero da mulher, o homem passou a considerá-la como uma simples caverna protetora. O pênis se tornou, então, objeto natural de adoração e fé religiosa. Na qualidade de 'phallos', era reverenciado da mesma forma que o órgão feminino tinha sido anteriormente.

O fenômeno do culto fálico se espalhou por todo o mundo antigo e é representado em vários monumentos em diferentes lugares. Em alguns templos dedicados a divindades fálicas, o deus esculpido em madeira era visitado com tanta frequência por mulheres estéreis e esperançosas, que o pênis se desgastava pelo manuseio, pelos beijos, fricções e sucções a que era submetido.

Para solucionar o problema, os sacerdotes fabricavam um falo muito comprido, que emergia de um orifício entre as coxas do deus. Quando a ponta se desgastava, eles, por trás da estátua, davam marteladas, empurrando um pouco o pênis. Entre os romanos encontramos, também, variados ritos de fertilidade. Nas festas da primavera, grandes representações de pênis eram carregadas ao redor dos campos a serem arados. Fertilizar os campos com o sêmen do homem também foi um costume muito difundido.

As estátuas do deus Hermes, com o pênis ereto, ornamentava fachadas de residências gregas. Aliás, a palavra Hermes era um sinônimo de pênis para os gregos. A genitália exposta e proeminente de sátiros e homens adornava vasos e taças. A Atenas da idade clássica tinha obsessão pelo pênis, era uma falocracia.

Entretanto, no ano de 415 a.C., os pênis das estátuas de Hermes, tão populares em toda Atenas, sofreram atentados, foram quebrados, causando desconforto geral entre os adoradores de Príapo, deus masculino. As mutilações de Hermes se tornaram fato intrigante entre os estudiosos do período. Havia também Dionísio, que ostentava volumoso membro viril.

Em Roma, o deus do prazer era Baco; no Egito, era conhecido como Osíris; na Índia, Shiva está em cada templo, com seu pênis. Os obeliscos, criados pelos egípcios, são homenagens ao membro do homem. São esculturas altíssimas, com a ponta em forma de pirâmide. Um deles, chamado de A agulha de Cleópatra, está no Central Park, em NovaYork.

Nas ruínas de Pompéia foram encontrados falos de bronze e terracota, com asas, rabos e pernas. Eles tinham a fama de possuírem poderes mágicos, usados como amuleto, no pescoço ou em braceletes. Em latim esses adornos eram conhecidos como fascinun, origem da palavra fascínio. Generais vitoriosos de Roma antiga desfilavam com um falo imenso sobre seu carro, para a sorte não lhes faltar em outros momentos.

Contudo, a valorização do pênis ereto e de grandes proporções permanece bastante atual em nossos dias. O culto ao falo, de forma inconsciente ou disfarçada, ainda continua presente na vida de muitos homens.

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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