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Regina Navarro Lins

A fuga do sedutor

Regina Navarro Lins

30/11/2013 09h24

Ilustração: Lumi Mae

Ilustração: Lumi Mae

Comentando o "Se eu fosse você"

A questão da semana é o caso da internauta que passou a noite sendo seduzida por um homem, mas quando disse que queria transar, ele desapareceu.

Nem todos os homens admitem que a mulher tome a iniciativa da proposta sexual. Ficam assustados ao se imaginar nessa situação. Têm medo de dar um branco na hora, de não saber como agir nem o que dizer. E o pior: pode falhar a ereção. Afinal, o papel de conquistador é o único que o homem conhece, e fora dele não dá para se sentir à vontade.

Desde cedo, o menino é treinando para isso e, para complicar ainda mais, acredita que faz parte da natureza masculina ser ativo e da feminina, a passividade. Mas é inegável que, apesar de tantos equívocos e limitações, antes o homem vivia bem menos ansioso nessa área do que agora.

O papel que homem e mulher desempenhavam no sexo sempre teve regras claramente estabelecidas. Fazia parte do jogo de sedução e conquista o homem insistir na proposta sexual e a mulher recusar. Contudo, ele apostava no seu sucesso e para isso não media esforços. Quanto mais ela recusava mais ele insistia e mais emocionante o jogo se tornava. Só para ele, claro.

Para a mulher era um tormento. Além de toda a culpa que carregava por estar permitindo intimidade a um homem, seu desejo era desconsiderado, assim como seu prazer. Como usufruir daquele encontro? Não podia relaxar um segundo. Ela sabia que, se não se controlasse, seria logo descartada e ainda por cima rotulada de fácil.

Mas o homem continuava insistindo, e ela dizendo não. Ele nem a percebia, o importante era chegar ao final. Jogo cruel para ambos, é verdade. Aprisionados à moral anti-sexual, nenhum dos dois tinha a menor chance de experimentar o prazer proporcionado pela troca de sensações eróticas. Se em algum momento a mulher cedesse, pronto. O homem se apaziguava com a confirmação da única coisa que buscava desde o início: se sentir competente e se afirmar como macho.

Entretanto, quando a mulher resistia às investidas, a autoestima dele não era abalada. Ele se apoiava na convicção de que o motivo da recusa se devia exclusivamente a ela ser uma mulher direita, de família. Assim, imune à preocupação de ter sido rejeitado por não agradar à parceira, continuava se sentindo poderoso e absoluto.

Toda essa encenação nos permite entender por que, até hoje, muitas mulheres se esquivam do sexo. Temendo ser usadas — e durante muito tempo foram mesmo —, se queixam com frases do tipo: "Os homens só querem sexo", o que à primeira vista poderia soar estranho, já que ninguém duvida de que sexo é bom.

Agora as coisas estão mudando. As mulheres dão sinais de não estarem nem um pouco dispostas a continuar se prestando a esse papel. Não querem apenas se mostrar belas e esperar passivamente que os homens se sintam atraídos e tomem a iniciativa. Isso está aos poucos se tornando coisa do passado. Mas como o homem vai resolver essa questão? Como vai se adaptar a essa nova realidade? O machão está em baixa, e a mulher busca homens que se relacionem com ela em nível de igualdade em tudo, também no sexo.

A situação do homem é bem complicada. Além de ser difícil aceitar a igualdade com a mulher, o temor de ser avaliado e comparado a outros homens gera insegurança. Sem contar que outras preocupações, nunca antes sentidas, estão agora presentes o tempo todo: ter o pênis pequeno ou fino, a ejaculação precoce, não obter ereção no momento desejado, não proporcionar orgasmo à mulher. Muitos homens continuam procurando mulheres recatadas e passivas, acreditando estar assim mais garantidos. O problema é que em pouco tempo se sentem insatisfeitos.

Com a liberação dos costumes e todas as informações que são oferecidas, não dá mais para ignorar as muitas possibilidades de prazer sexual que um ser humano pode experimentar. Somente pessoas livres, que gostam de sexo e não têm preconceitos, estão em condições de compartilhar dessas descobertas com o parceiro.

Esses conflitos só vão ser resolvidos quando o sexo for aceito como algo bom, natural, que faz parte da vida. E não se precisar mais atribuir a ele motivos que não lhe são próprios.

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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