A inveja no amor
Comentando a Pergunta da Semana
Quase a metade das pessoas que responderam à enquete da semana já sentiu inveja da pessoa amada. Isso não é raro acontecer. No consultório já ouvi diversos casos de relações amorosas que são prejudicadas pela inveja de um dos parceiros.
Às vezes conhecemos duas pessoas que vivem juntas, mas são tão diferentes entre si! Será que conseguem se entender? Como será o cotidiano delas? Sempre ouvimos dizer que os opostos se atraem. Mas será que essa lei da física também pode ser aplicada ao relacionamento amoroso?
O caso de Suzana ilustra bem como é difícil essa situação. Ela e Paulo são médicos e estão casados há oito anos. A relação nunca foi muito fácil devido à competição do marido com ela e às constantes críticas que ele lhe faz. Há três meses Suzana procurou terapia por estar em dúvida quanto à manutenção do casamento:
"Paulo sempre tentou me derrubar. No início do casamento não dava para perceber muito, porque eu tinha acabado de me formar e ainda não tinha emprego. Na medida em que fui melhorando na profissão, nossa vida começou a piorar. Se penso em fazer um novo concurso ele sempre arranja um jeito de me desestimular. Quando decidi dividir um consultório com uma colega, ele colocou todos os defeitos e me apavorou com a ideia de que eu não conseguiria clientes e só teria despesas. Sem contar as críticas que faz pelo meu jeito de ser. Ele é tímido e diz que sou comunicativa em excesso. Somos diferentes em muitos aspectos, mas o problema é que o tempo todo tenho que fazer um grande esforço para não me sentir diminuída e com a autoestima abalada. Agora ele deu até para inventar que estou com celulite. Acho que não dá mais."
É possível que as pessoas se encantem por outras que possuem características de personalidade que elas não têm e gostariam de ter. A minha dúvida é se numa relação entre pessoas tão diferentes há espaço para uma vida a dois verdadeiramente satisfatória.
Quando um homem muito tímido e inseguro se casa com uma mulher extrovertida, falante, cheia de amigos, o que pode acontecer à vida deles? À primeira vista só coisas boas, claro. Ela possui o que falta a ele e, portanto, pode ajudá-lo a ser mais comunicativo, se soltar mais, conhecer mais pessoas.
Pense bem, um complementa o outro. Esse encaixe parece ser a solução perfeita. Além do tímido e da extrovertida, conhecemos também o decidido e a indecisa, o animado e a deprimida, o alienado e a sabe-tudo, a corajosa e o medroso, entre outros. Sem contar que existem várias outras diferenças sutis, difíceis de serem percebidas.
Mas na maioria dos casos essa situação é bem mais complicada do que parece, e surgem problemas. O primeiro deles é a acomodação. Ela impede o crescimento pessoal; o indeciso acaba deixando o outro resolver todas as questões que necessitem de decisão, não se empenhando para modificar o que não gosta em si próprio.
Entretanto, a inveja é o inconveniente mais sério. Há quem diga até que a inveja nasce imediata e espontaneamente da admiração. Será que quando admiramos e nos encantamos tanto por alguém oposto a nós, estamos realmente satisfeitos com o que somos?
O invejoso admira o invejado, desejaria estar em seu lugar, ser como ele é e não consegue. O pior é quando o invejoso, não suportando a sua própria inveja, passa a depreciar no outro, justamente os aspectos que gostaria de possuir. Ou então, o que também ocorre com frequência, sutilmente sabota as realizações do parceiro, numa tentativa desesperada de diminuir seu sentimento de inferioridade.
Na fase do encantamento apaixonado a inveja não se manifesta, por mais diferentes que sejam as pessoas. O que elas vivenciam é a ilusão da fusão romântica, em que os dois se transformam num só. Nesse momento não se deseja nada do outro além do seu amor. Contudo, todos sabemos que esse período inicial de paixão não resiste à convivência cotidiana. Portanto, quando a inveja surge é um sinal de que o encantamento chegou ao fim.
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