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Regina Navarro Lins

Nudez sob controle

Regina Navarro Lins

05/01/2016 09h24

Ilustração: Lumi Mae

Ilustração: Lumi Mae

 

Comentando a Pergunta da Semana

A maioria das pessoas que respondeu à enquete da semana já sentiu vergonha de ficar nu na frente do parceiro. Isso pode ocorrer pela ideia de que o corpo nu é indecente ou pelo medo de ser rejeitado por não preencher as expectativas de beleza na nossa cultura.

As antigas civilizações tinham uma atitude bastante diferente da nossa diante da nudez e do sexo. Desconheciam o conceito de obscenidade, comum atualmente.

Por mais que as imagens dos órgãos sexuais masculinos e femininos fossem exageradas e distorcidas, eram encaradas com naturalidade. Muitos santuários espalhados pelo mundo mostram representações de vulvas e falos, inclusive com deuses possuidores de falos monumentais.

Mas na Roma Antiga havia três proibições:

— Fazer sexo antes do cair da noite (sexo durante o dia devia continuar sendo privilégio dos recém-casados logo após as núpcias);

— Fazer sexo sem criar penumbra (os poetas eróticos tomavam como testemunha a lâmpada que brilhara sobre seus prazeres);

— Fazer sexo com uma parceira que ele havia tirado toda a roupa (só as prostitutas amavam sem sutiã e nas pinturas dos bordéis de Pompéia elas conservavam esse último véu).

As carícias, desde que sejam feitas com a mão esquerda, ignorada pela direita. Um homem honesto só teria oportunidade de vislumbrar a nudez da amada se a lua passasse na hora certa pela janela aberta.

Na Idade Média, visando a procriação, os casais são autorizados a dormir nus. Mas mesmo no casamento, o nu permanece uma situação perigosa. A representação de cônjuges nus em um leito pode ser percebida como um sinal de luxúria.

Assim, a nudez oscila entre a beleza e o pecado, a inocência e a malignidade. A partir do século 13, a frequência das representações de Adão e Eva testemunha essa atração da nudez física humana sobre os medievais.

No século 19, o código de boas maneiras não permitia que uma moça de boa família se admirasse nua. Ela não podia se olhar no espelho nem mesmo ver seu corpo através dos reflexos da água da banheira. Havia produtos especiais para turvar a água do banho, de forma a impedir tal vergonha.

Assim, as mulheres conheciam mal seus próprios corpos; proibiam-lhes até de entrar nos museus de anatomia. Na Inglaterra, a nudez total, por ocasião do dever conjugal, é considerada o cúmulo da obscenidade.

Era comum os casais jamais terem se visto sem roupa. Há registros de camisolas com furos na altura da vagina por onde o homem penetrava a mulher. Para o marido vitoriano não era uma tarefa simples o sexo conjugal, que tinha como ingredientes o homem cheio de remorsos e a mulher frígida. O ato sexual era composto de desejos e lágrimas, de ansiedade e sentimento de culpa.

No século 20, a novidade na cama foi o destaque dado às preliminares. Até então o ato sexual foi conduzido de maneira bastante primitiva, inteiramente reservada à satisfação muito rápida do homem.

A sexualidade oral se desenvolveu. A descoberta do corpo entrou em ação, diretamente ligada ao progresso da higiene íntima. A limpeza era exigida. Entretanto, as pessoas não ousavam se mostrar nuas.

Dentro do quarto os casais se despiam, mas ficavam no escuro. Os jovens casais dos anos entre as duas guerras tiveram pais educados no século 19, aos quais foram inculcadas regras de pudor muito estritas.

Contudo, a partir dos anos 1930, as mulheres passaram a ir à praia, usar maiôs, shorts, vestir saias-calças para andar de bicicleta. Pouco a pouco, os corpos foram se desvendando.

Hoje, a exigência de ter um corpo magro também acarreta sérios problemas. Sheila, chegou ao meu consultório e foi logo dizendo:

"Estou namorando o Tiago há um ano. Pensamos de forma parecida sobre vários aspectos da vida e gostamos das mesmas coisas. Nosso sexo é frequente e realizamos muitas fantasias. Nossa relação é ótima afetiva e sexualmente. Mas há algo que me deixou muito mal: comecei a perceber que ele nunca queria sair juntos com seus amigos e que ficava constrangido quando me apresenta a algum deles. Conversei com ele e fiquei arrasada com o que descobri: Tiago tem vergonha de mim por eu ser gordinha!

Na nossa cultura o pior preconceito que existe é contra a pessoa gorda. A exigência estética é tão grande que, para tentar atenuar essa ditadura da magreza, a Associação Médica Americana estabeleceu novos padrões de peso, aumentando a medida de peso ideal, visando afrouxar um pouco essa cobrança.

Homens e mulheres são escravizados pelo mesmo padrão de beleza, embora a mulher se importe menos de namorar um homem gordo. Como o homem foi educado a ter que provar que é o melhor o tempo todo, não é raro encontrarmos os inseguros, que dependem da avaliação estética que os amigos fazem de suas escolhas amorosas para se sentirem valorizados ou não.

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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