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Regina Navarro Lins

O mito da vagina dentada e o pavor que provoca nos homens

Regina Navarro Lins

15/08/2015 07h00

Ilustração: Lumi Mae

Ilustração: Lumi Mae

Comentando o "Se eu fosse você"

A questão da semana é o caso do internauta que se considera saudável em todos os aspectos, mas se julga defeituoso por conta do pânico que sente quando vai penetrar uma mulher. Para ele a vagina é vista como um grande perigo, o que o faz temer nunca conseguir ter uma relação sexual completa.

Sendo os órgãos sexuais de mulheres e homens tão diferentes, tornam-se de alguma forma misteriosos para o outro sexo. Embora na mulher possa existir algum temor pelo pênis do homem, nada se compara ao temor que os homens sentem pela vagina. É um perigo ameaçador porque não é visível e porque suas propriedades são estranhas.

"O que destrói o homem é a vulva", dizia um velho maori, aborígine da Nova Zelândia. O que era explicado melhor por australianos da região central: "A vagina é muito quente, é um fogo e cada vez que o pênis ali penetra morre." Os maoris ainda associam a vagina à morte. Os nomes que usam para designá-la são "casa da morte e da desgraça" e "buraco destruidor".

Nos mitos, a vagina é representada alternadamente como força devoradora, devastadora, insaciável, uma caverna com dentes, que causa pesadelos e, finalmente, a morte. Na Índia, inúmeras lendas falam de mulheres cuja vagina está cheia de dentes. O pênis do homem seria decepado por tal monstruosa boca. Esse medo é ligado inicialmente ao do sangue menstrual, assustador e doentio, já que é objeto de imensa quantidade de tabus, mas também o sangue da defloração, que muitos acreditam trazer azar.

Simone De Beauvoir observa que na maioria das representações populares, a morte é mulher. O caos de onde tudo saiu e para onde tudo deve voltar.
A escritora americana Camile Paglia, especula que os mitos em relação à vagina são transcrições diretas do poder feminino e do medo masculino. O horror de ser castrado no momento do coito atribui poder às mulheres.

A vagina dentada é um símbolo poderoso de castidade, acentuando o mistério da sexualidade feminina especialmente da anatomia genital e seu poder. A representação mais atual desse fenômeno é a aranha Viúva Negra; ela permite sexo para a reprodução e depois mata seu parceiro. A vagina dentada também permitiria a penetração apenas para a castração depois do ato.

No Ocidente, no século 12, vários textos aconselhavam os homens a tomar distância em relação à mulher devido ao seu desejo sexual incontrolável. Na França, o bispo Etienne de Fougère, falando sobre as mulheres, exortava os homens a mantê-las bem trancadas.

Alegava que se elas estivessem entregues a si mesmas, sua sexualidade se exacerbaria de tal forma que procurariam se satisfazer com os empregados, ou então entre si. Hoje, apesar de essas crenças sobre a vagina e a sexualidade feminina serem vistas como absurdas para muita gente, no inconsciente elas parecem ainda exercer enorme influência.

Sem dúvida, o internauta que relata a sua dificuldade, precisa de uma terapia que o ajude a entender todo o medo que sente no ato sexual e a se livrar dele.

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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