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Regina Navarro Lins

Além do casal

Regina Navarro Lins

03/01/2015 07h00

Ilustração: Lumi Mae

Ilustração: Lumi Mae

Comentando o "Se eu fosse você"

A questão da semana é o caso da internauta que gosta muito do namorado, mas sente atração por outros homens. Já transou com alguns e se sente culpada. Diz que lhe dói pensar que pode perder um relacionamento muito legal, porque gosta de ter romances com outros homens.

Apesar de no século 19 muitas teorias terem sido criadas afirmando que a mulher não se interessa por sexo, que seu único prazer seria cuidar dos filhos, isso não corresponde à visão predominante na história da sexualidade humana.

As mulheres mulçumanas têm o costume de usar véu porque os povos islâmicos acreditam que elas são extremamente sedutoras. A extirpação do clitóris é realizada em várias culturas africanas para conter a elevada libido feminina.

A antropóloga americana Helen Fisher acredita que se tivéssemos perguntado a Clellan Ford e a Frank Beach, pesquisadores sexuais dos anos 50, qual dos dois sexos era mais interessado na variedade sexual, eles teriam respondido: "Naquelas sociedades que não têm padrões duplos nas questões sexuais, e em que é permitida uma variedade de ligações, as mulheres utilizam tão ansiosamente suas oportunidades quanto os homens."

Kinsey concordava dizendo: "Mesmo naquelas culturas que tentam com mais rigor controlar o coito extraconjugal feminino, está absolutamente claro que tal atividade ocorre, e em muitos casos ocorre com considerável regularidade."

A dependência econômica da mulher foi uma motivação importante da tendência monogâmica presente em nossa cultura. O marido jamais admitiria uma infidelidade e dessa forma ela não teria como sobreviver. O homem teme um rival mais competente no sexo e tem pavor de ser estigmatizado como corno. Isso demonstraria a todos que ele não soube se fazer respeitar e que não foi suficientemente homem para segurar a mulher.

O fracasso em corresponder ao ideal masculino da sociedade patriarcal o exporia ao ridículo e ao desprezo. Para W.Reich, o mesmo não acontece se o marido é infiel. Uma mulher enganada não é desprezada, mas lamentada, pois a infidelidade do marido constitui um perigo real para a mulher economicamente dependente. Por isso, sempre houve mais condescendência para com a infidelidade do marido.

O duplo padrão do adultério – homem pode, mulher não – está desaparecendo. Durante cinco mil anos os homens acreditaram ser somente deles esse direito. Mas começam a pensar diferente. A pílula anticoncepcional, possibilitando o movimento de emancipação feminina e a revolução sexual, foi fundamental para a mudança das mentalidades.

Há estudos que investigam o "fenômeno da discrepância paterna", ou seja, filhos que são gerados por homens que não são os maridos das mães. Um deles, feito por biólogos ingleses, anunciou que aproximadamente 9% das crianças estão incluídas nesta categoria. Uma matéria do Times de Londres foi mais alarmista, afirmando que "uma proporção elevada, de uma em cada sete crianças, não era gerada pelo homem que acredita ser o pai."

Essa mesma desconfiança foi a responsável, durante cinco mil anos, pelo encarceramento da mulher dentro de casa. Ela foi proibida de aparecer diante de estranhos. O homem ficou obcecado pela certeza de paternidade, afinal, não lhe agradava a ideia de deixar a herança para o filho de outro. Se considerarmos os métodos anticoncepcionais existentes hoje, e o fato de a grande maioria das relações sexuais não terem como objetivo a gravidez, os números que os estudos apontam são bastante elevados.

Uma pesquisa realizada com 106 mil leitoras da revista americana Cosmopolitan no início dos anos 80 indicou que 54% das mulheres casadas tiveram pelo menos um caso extraconjugal, e a pesquisa de Shere Hite, na mesma época, abrangendo 7239 homens, relatou que 72% dos casados há mais de dois anos tiveram relações extraconjugais.

Estes dados, tanto para mulheres quanto para homens, foram depois verificados por outros pesquisadores. Os estudos também demonstram que duas novas tendências surgiram: ambos os sexos começaram a ter relações extraconjugais mais cedo que nas décadas anteriores , e o padrão duplo foi corroído. Todos esses dados nos levam a suspeitar que as mulheres têm relações extraconjugais com a mesma satisfação, e talvez até com a mesma avidez que os homens.

Muitos ainda acreditam que as mulheres fazem sexo para ter amor e os homens dão amor para ter sexo. Esse padrão de comportamento, assim como a ideia de que a mulher só tem relação extraconjugal motivada por uma grande paixão, e o homem só para fazer sexo, estão saindo de cena.

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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