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Regina Navarro Lins

Quando a proposta sexual é da mulher

Regina Navarro Lins

26/07/2014 07h00

Ilustração: Lumi Mae

Ilustração: Lumi Mae

Comentando o "Se eu fosse você"

A questão da semana é o caso da internauta que um colega de trabalho seduzia de todas as formas e insistia a para irem a um motel. Quando ela decidiu aceitar, e propôs fazerem sexo naquele dia, ele passou a evitá-la e não tocou mais no assunto. Sem dúvida, é um relato curioso. O que aconteceu? Se ele não desejava transar com ela, por que insistiu tanto?

A partir de um estudo que durou nove anos, o americano Anthony Astrachan publicou o livro 'Como os homens se sentem', onde explica como a tentativa de demonstrar força, sucesso e poder, características cobradas do homem numa sociedade patriarcal, leva à perda da autonomia.

Sobre a recusa das mulheres em continuar subordinadas, ele concluiu que apenas 5 a 10% dos homens chegam perto de aceitar as mulheres como iguais, enquanto os demais expressam seus sentimentos de raiva, medo e inveja por meio de uma hostilidade evidente ou dissimulada. E o que os homens consideraram terrivelmente ameaçador nas mulheres é a combinação de competência e sexualidade.

Muitos homens ficam assustados quando a mulher faz alguma proposta sexual. Têm medo de dar um branco na hora, de não saber como agir nem o que dizer. E o pior: pode falhar a ereção. Afinal, o papel de conquistador é o único que o homem conhece, e fora dele não dá para se sentir à vontade.

Desde menino ele foi treinando para isso e, para complicar ainda mais, acreditou que faz parte da natureza masculina ser ativo e da feminina, a passividade. Mas é inegável que, apesar de tantos equívocos e limitações, ele antes vivia bem menos ansioso nessa área do que agora.

O papel que homem e mulher desempenhavam no sexo sempre teve regras claramente estabelecidas. Fazia parte do jogo de sedução e conquista o homem insistir na proposta sexual e a mulher recusar. Contudo, ele apostava no seu sucesso e para isso não media esforços. Quanto mais ela recusava mais ele insistia e mais emocionante o jogo se tornava. Só para ele, claro.

Para a mulher era um tormento. Além de toda a culpa que carregava por estar permitindo intimidade a um homem, seu desejo era desconsiderado, assim como seu prazer. Como usufruir daquele encontro? Não podia relaxar um segundo. Ela sabia que, se não se controlasse, seria logo descartada e ainda por cima rotulada de fácil.

Mas o homem continuava insistindo, e ela dizendo não. Ele nem a percebia, o importante era chegar ao final. Jogo cruel para ambos, é verdade. Aprisionados à moral anti-sexual, nenhum dos dois tinha a menor chance de experimentar o prazer proporcionado pela troca de sensações eróticas. Se em algum momento a mulher cedesse, pronto. O homem se apaziguava com a confirmação da única coisa que buscava desde o início: se sentir competente e se afirmar como macho.

Entretanto, quando a mulher resistia às investidas, a autoestima dele não era abalada. Ele se apoiava na convicção de que o motivo da recusa se devia exclusivamente a ela ser uma mulher "direita, "de família". Assim, imune à preocupação de ter sido rejeitado por não agradar à parceira, continuava se sentindo poderoso e absoluto.

Agora as coisas mudaram. As mulheres dão sinais de não estarem nem um pouco dispostas a continuar se prestando a esse papel. Não querem apenas se mostrar belas e esperar passivamente que os homens se sintam atraídos e tomem a iniciativa.

Isso está aos poucos se tornando coisa do passado. Mas como o homem vai resolver essa questão? Como vai se adaptar a essa nova realidade? O machão está em baixa, e a mulher busca homens que se relacionem com ela em nível de igualdade em tudo, também no sexo.

Em várias partes do mundo os homens já demonstram insatisfação em ter que corresponder ao que deles se espera, e discutem cada vez mais a desconstrução do masculino, fazendo a mesma pergunta feita por John Lennon: "Não está na hora de destruirmos a ética do macho?… A que nos levaram todos esses milhares de anos?"

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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