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Amor nada convencional: eles moram na mesma cidade e se veem a cada 15 dias

Universa

05/09/2019 04h00

Quando estava escrevendo meu último livro, "Novas Formas de Amar", entrevistei Carol para o capítulo "Vida a dois fora da curva". Ela vive uma relação amorosa bem diferente da maioria. É professora universitária, separada há muitos anos do primeiro casamento, e namora Fred. Eles moram na mesma cidade, mas só se encontram de 15 em15 dias e é raro se falarem nesse intervalo. Selecionei alguns trechos do que Carol me contou.

Quando vocês começaram o relacionamento?
Conheci o Fred em 2008, exatamente na entrada dos meus 50 anos. Ele tinha 53. Estamos juntos há nove anos. Eu vinha de três casamentos, de tentativas variadas de convivência: um casamento sem filhos, um casamento com filhos e um casamento em casas separadas. Tinha muita certeza de que não desejava casar de novo, pois as investidas anteriores já tinham me passado o atestado de "incompetência" para morar junto.

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Por quê?
Sempre achei dificílimo manter o amor na relação cotidiana. Os desgastes das banalidades do dia a dia me distraíam completamente das coisas boas do relacionamento e, quando dava por mim, as relações estavam acomodadas e, o que mais incomodava — a mim e ao parceiro — sem tesão.

Mas o amor continuava?
Sim. Só que virava uma relação de muito amor, mas de amor fraterno. Mesmo morando em casas separadas percebi que eu trazia pra relação os mesmos vícios dos casamentos anteriores, sobretudo a patrulha e o certificado de propriedade. E era justamente essa sensação de posse que amornava a forma com que eu me relacionava.

O que os amigos dizem desse namoro?
Interessante que algumas pessoas confundem e acham que evitamos uma relação mais profunda, quando é justamente o contrário. A liberdade de
sermos quem somos nos aproxima demais. Tenho certeza de que posso contar com ele para o que eu precisar e a qualquer hora, e vice-versa.

Como surgiu esse relacionamento tão diferente da maioria?
Como ele estava em Brasília, nos encontrávamos de 15 em 15 dias, o que era ótimo, pois no fim de semana que não nos encontrávamos, eu podia continuar fazendo as coisas de que gostava e que não incluem o outro: meu trabalho (que amo!), os encontros com amigos que não têm a ver com ele, um domingo de leitura e estudo, uma caminhada solitária pela Lagoa [Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro] etc. Tudo sempre foi muito leve, divertido, pois nos damos bem e temos temperamentos semelhantes. Depois dos 50, não há mais como a gente se juntar para o desprazer, né? Descobrimos que adoramos viajar e somos excelentes companheiros de viagem. Então, vivemos com o pé no mundo, sempre que podemos.

O que fez vocês decidirem, apesar de morarem na mesma cidade, se encontrarem somente de 15 em 15 dias?
Passados uns três anos desse namoro, ele veio transferido de volta pro Rio. Daí, crise no casal: como passar a se ver toda semana?!? Ficamos um pouco preocupados dessa proximidade mudar as coisas entre a gente, pois estávamos muito acostumados com os encontros quinzenais. Foi então que Fred propôs: "E não dá pra gente continuar se vendo de 15 em 15 dias?".  Nossa! Aquilo foi espetacular! Realmente, não tinha sentido mudar nada, só porque ele ia voltar pro Rio. Então, nos mantemos até hoje com esse jeito de levar a vida a dois, mesmo morando a 20 minutos de distância um do outro.

Vocês se falam nesse intervalo?
Mandamos torpedos ou nos telefonamos quando dá saudade mesmo. Não temos a menor obrigação de nada. Fred abomina aquela pergunta "O que você fez hoje?", e eu o entendo. Um não tem que saber, burocrática e obrigatoriamente, do dia do outro. Às vezes passamos horas no telefone! Ambos falamos muito. Mas não há uma frequência. A saudade é o que determina, mesmo. E é uma delícia quando, no meio do dia, aparece um torpedo apaixonado ou apimentado.

Quando não é o fim de semana de se encontrarem, você fica preocupada com o que ele pode estar fazendo, se está saindo ou transando com outra mulher?
Eu prefiro me concentrar nas minhas coisas, sabe? Faz tempo que entendi que não há controle sobre o outro. O que tiver que rolar, vai rolar, eu estando na cola ou não. E vice-versa! Então, não ficamos rastreando um ao outro. Temos uma coisa bem definida: se perguntar, é porque quer ouvir a resposta. Sinceramente? Prefiro nem perguntar! (risos)

Bate insegurança? Ciúmes?
Não. A distância/proximidade não é determinante pra nada. Tenho as minhas inseguranças, mas não sinto que são potencializadas por eu não estar "controlando". Ciúme eu teria se o percebesse num movimento para outra pessoa. Como não estou vendo, não tenho.

Muitos dizem que em um relacionamento assim se corre mais risco de perder o outro. Você acredita nisso?
Não. Justamente porque não é a convivência que determina a estabilidade da relação. Penso até que estamos juntos há tanto tempo porque não nos
"possuímos", não nos cobramos, porque sabemos dar espaço para o outro viver suas coisas. Queremos parecido.

Vocês se sentem livres pra transar com outras pessoas? Combinaram alguma coisa sobre isso?
Nunca houve um patrulhamento nesse sentido. Nunca senti necessidade de combinar, mas deixei claro que não quero saber, a não ser que seja algo que interfira na nossa relação, uma paixão, por exemplo. Se acontecer, vou morrer de ciúme, mas está no rol das coisas que não podemos controlar.

Quais as vantagens de um relacionamento dessa forma?
A maior vantagem é eu não me perder de mim, continuar tendo noção do que é meu e o que é do outro, pois já tive uma tendência a me embolar. Nesses nove anos juntos, poucas vezes perdemos essa percepção de nossa
individualidade. Quando aconteceu, conversamos e corrigimos a rota. Como ele diz, "o difícil é justamente não mudar nada". Amo o Fred pelo que ele é, e não por uma promessa de segurança. A outra grande vantagem é que, nesse hiato, morremos de saudades um do outro e ficamos ansiosos pra chegar o dia do encontro. Sabe lá o que é isso depois de tanto tempo de relacionamento? Nossa convivência é uma delícia. Somos felizes e sabemos.

E as desvantagens?
Sinceramente? Desconheço.

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Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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