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O desempenho sexual do machão

Regina Navarro Lins

21/04/2015 07h00

Ilustração: Lumi Mae

 

Comentando a Pergunta da Semana

A maioria das pessoas que responderam à enquete acredita que o machismo prejudica o desempenho sexual masculino.

Mas acho que vai além; o machismo também prejudica muitos aspectos da vida de ambos os sexos. Homens e mulheres foram inibidos na sua capacidade para o prazer sexual. As mulheres tiveram sua sexualidade reprimida e distorcida, a ponto de até hoje muitas serem incapazes de se expressar sexualmente, muito menos atingir o orgasmo.

Os homens, por sua vez, também tiveram a sexualidade bloqueada. A preocupação em não perder a ereção é tanta que fazem um sexo apressado, com o único objetivo de ejacular. A mulher acaba se adaptando ao estilo imposto pelo homem, principalmente por temer desagradá-lo. Resultado? Nenhum dos dois usufrui do prazer que um bom sexo proporciona.

A sexualidade típica do machão é na maioria dos casos impessoal, estereotipada e limitada. Cumprir o papel de macho é o principal objetivo. Trocar afeto e prazer com a parceira é secundário. Importante mesmo é o pênis ficar ereto, bem rígido e ejacular bastante. A mulher, para tal homem, só é interessante como meio de lhe proporcionar esse prazer que, na realidade, não tem nada a ver com prazer sexual.

Durante muito tempo a visão que se teve da mulher, e na qual ela também acreditou, era assim: frágil, desamparada, necessitando desesperadamente encontrar um homem que lhe desse amor e proteção e, mais do que tudo, um significado à sua vida.

Mas quando começou o movimento de emancipação feminina, os homens ainda acreditavam que não tinham nada do que se libertar, desprezando o fato de que o sistema patriarcal oprime ambos os sexos, e estar submetido ao mito da masculinidade não é nada fácil.

A maioria dos homens ainda persegue o ideal masculino – força, sucesso, poder –, mas eles têm as mesmas necessidades psicológicas das mulheres: amar e ser amado, comunicar emoções e sentimentos. A questão é que desde crianças são ensinados a desprezar as emoções delicadas e a controlar os sentimentos.

Demonstrar ternura, se entregar relaxado à troca de prazer sexual com a parceira, é difícil; perder o controle ou falhar é uma ameaça constante. O processo de socialização que transforma os meninos em homens "machos" impede a espontaneidade na relação com as mulheres. É impossível ser amoroso quando se é "travado" emocionalmente.

Nos papos com os amigos eles aprendem a contar vantagens, suas conquistas sexuais e detalhes engraçados sobre as transas, muitas vezes desvalorizando as mulheres. Se os fatos correspondem ou não à realidade é o que menos importa. O sexo passa a ser um esporte, um jogo, em que se disputa a dominação da mulher.

Esse roteiro "homem-caçador"/ "mulher-presa" causa sérios prejuízos à sexualidade masculina. Os homens são levados a organizar sua energia e percepção em torno do desempenho e, assim, se transformam em máquinas de fazer sexo, preocupados apenas em "marcar pontos" e ter ereções.

Apesar das aparências em contrário, na vida adulta a sexualidade masculina continua sendo uma experiência ansiosa e limitada. Poucos homens conseguem conhecer a intimidade emocional com a mulher, em vez de somente a sexual.

Pesquisas mostram que os homens que definem as relações humanas em termos de papéis rígidos "masculino-superior" e "feminino-inferior", assim como os que definem sua identidade masculina em termos de controle, violência e repressão dos afetos, apresentam, em muitos casos, um quadro de deterioração da sexualidade.

É inegável que a masculinidade está em crise. Nos últimos quarenta anos foi constatado nos homens o aumento da depressão psicológica e em vários países registram-se doenças do homem esgotado. Todo o esforço exigido deles para ser considerados "homens de verdade" provoca angústia, medo do fracasso e dificuldades afetivas.

Mas como resolver o impasse entre a proibição social de expressar sentimentos considerados femininos e a crítica cada vez mais acirrada ao homem machista? Como os homens podem recuperar sua autonomia?

Talvez o jeito seja se unir às mulheres e, examinando o mito da masculinidade, repudiar essa masculinidade como natural e desejável. Nem todos aceitam o roteiro do macho e cada vez mais homens, em todo o mundo, tomam consciência da desvantagem desse papel e empreendem a desconstrução e a reconstrução da masculinidade.

Pouco antes de ser assassinado, John Lennon declarou publicamente: "Gosto que se saiba que, sim, cuido do bebê e faço pão, que eu era dono de casa e me orgulho disso." E se isso fere o papel masculino, ele pergunta: "Não está na hora de destruirmos a ética do macho?… A que nos levaram todos esses milhares de anos?"

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Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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