Sem exigência de exclusividade
Regina Navarro Lins
23/09/2014 07h00
Comentando a Pergunta da Semana
A maioria das pessoas que responderam à enquete da semana desejaria viver uma relação sem exclusividade. Mas esse é um tema bastante polêmico.
Muitos associam fidelidade à exclusividade. E isso pode ser um grande equívoco. Penso que a fidelidade está no sentimento que se nutre pelo outro e nas razões que sustentam a relação. Os termos fiel/infiel e mais ainda a palavra traição talvez não sejam apropriados para caracterizar relações extraconjugais.
No casamento um episódio extraconjugal pode ocasionar dois resultados: é apenas passageiro e não rivaliza com a relação estável, que sai até reforçada — a pessoa não se sente coagida à obrigatoriedade de ter um único parceiro — ou a nova relação se torna mais intensa e mais prazerosa que a anterior e rompe-se então com a antiga.
O parceiro que é excluído, que não deseja a separação por continuar amando, vai passar por momentos difíceis. Por mais que compreenda racionalmente as razões do outro e concorde que não há alternativa — afinal isso faz parte da vida — o sentimento de ter sido rejeitado é inevitável.
Alguns tentam a reconquista. Nesse processo, desaparece o automatismo que havia na relação prolongada e também a certeza de posse. Outros, mesmo sofrendo, preferem manter-se na expectativa do que vai acontecer. Seja qual for a evolução, ela será sempre melhor do que o martírio de duas pessoas acorrentadas uma à outra por razões morais.
O psicoterapeuta José Ângelo Gaiarsa afirma que somos por tradição sagrada tão miseráveis de sentimentos amorosos que, em havendo um, já nos sentimos mais do que milionários e renunciamos com demasiada facilidade a qualquer outro prêmio lotérico (de amor).
As restrições que muitos têm o hábito de se impor por causa do outro ameaçam bem mais uma relação do que uma "infidelidade". Reprimir os verdadeiros desejos não significa eliminá-los.
O parceiro que teve excessiva consideração tende a se sentir credor de uma gratidão especial, a considerar-se vítima, a tornar-se intolerante. Quando a fidelidade não é natural nem a renúncia gratuita, o preço se torna muito alto e pode inviabilizar a própria relação.
W.Reich afirma que nunca se denunciará bastante a influência perniciosa dos preconceitos morais nessa área. E que todos deveriam saber que o desejo sexual por outras pessoas constitui parte natural da pulsão sexual, que é normal e nada tem a ver com a moral.
Se todos soubessem, as torturas psicológicas e os crimes passionais com certeza diminuiriam e desapareceriam também inúmeros fatores e causas das perturbações psíquicas que são apenas uma solução inadequada destes problemas.
Sobre a autora
Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.
Sobre o blog
A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.