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Homofobia - ódio dos homossexuais

Regina Navarro Lins

01/07/2014 07h00

Ilustração: Lumi Mae

Comentando a Pergunta da Semana

A maioria das pessoas que responderam à enquete da semana considera que a origem da homofobia é a tentativa de alguns homens de ocultar seu próprio desejo homossexual. A homossexualidade provoca preconceito e ódio.

Arthur, funcionário de loja de materiais esportivos, que atendi no consultório, contou-me a terrível experiência de ser discriminado por um dos clientes: "Sou e sempre fui gay, mas nunca tinha vivido algo parecido. Um homem entrou na loja e pediu a um vendedor para auxiliá-lo na compra de roupas de esquiar na neve. Esse vendedor estava ocupado e pediu que eu o atendesse. Quando me dirigi a ele, ouvi seus gritos dizendo que queria ser atendido por um homem e se recusava a ser atendido por um 'viado'. Isso na frente de todos e de uma forma bem agressiva."

Apesar de toda a liberação dos costumes, os gays ainda são hostilizados pela maior parte da sociedade, que associa masculinidade à heterossexualidade. Uma pesquisa sobre violência no estado de Nova York, EUA, concluiu que, entre todos os grupos minoritários, os homossexuais são objeto de maior hostilidade. Além dos insultos habituais, os ataques físicos são mais do que comuns.

Mas nem sempre foi assim. Na Grécia clássica, século V a.C., a homossexualidade era uma instituição e os gregos não se preocupavam em julgá-la. Em algumas cidades gregas, a homossexualidade aparece como uma prática necessária dos ritos de passagem da juventude cívica, num quadro regido pelas leis, mas se relacionando estreitamente com a masculinidade.

O amor por um jovem dotado de fascínio físico e intelectual aperfeiçoava o caráter tanto do amante como do amado. O Batalhão Sagrado de Tebas – quadro de tropas de choque era composto inteiramente de casais homossexuais.

Nos séculos 12 e 13, entretanto, começou na Europa uma repressão maciça da homossexualidade, como parte de uma campanha contra heresias de toda natureza, que evoluiu até o terror da Inquisição. Por conta das perseguições, ela se tornou perigosa e clandestina. No século 19, a atividade homossexual deixou de ser classificada como pecado e passou a ser considerada doença.

O tabu contra ela só diminuiu com o surgimento dos anticoncepcionais, na década de 1960. A dissociação entre o ato sexual e a reprodução, possibilitou aos homossexuais sair da clandestinidade, na medida em que as práticas homo e hétero, ambas visando ao prazer, se aproximaram. Apesar de, hoje, a homossexualidade não ser mais considerada doença, a discriminação continua.

A homofobia deriva de um tipo de pensamento que equipara diferença à inferioridade. E quem são os homofóbicos? Alguns estudos indicam que são pessoas conservadoras, rígidas, favoráveis à manutenção dos papéis sexuais tradicionais. Quando se considera, por exemplo, que um homem homossexual não é homem, fica clara a tentativa de preservação dos estereótipos masculinos e femininos, típicos das sociedades de dominação.

Na nossa sociedade, os meninos aprendem desde cedo que não devem ter qualquer tipo de contato físico com homem. As amizades masculinas são raras, se restringindo geralmente a encontros em grupo ou competições esportivas. O abraço entre dois homens é pouco frequente e o afeto é manifestado no máximo com aperto de mão ou tapinha nas costas.

Muitos pais não abraçam nem beijam seus filhos depois de uma determinada idade. É muito provável que esta restrição vise preservar o conceito ideal da sociedade do que seja "másculo". A demonstração de afeto entre as mulheres é aceita por todo mundo e não parece despertar temores de que irá incentivar o lesbianismo.

A homofobia reforça a frágil heterossexualidade de muitos homens. Ela é, então, um mecanismo de defesa psíquica, uma estratégia para evitar o reconhecimento de uma parte inaceitável de si. Dirigir a própria agressividade contra os homossexuais é um modo de exteriorizar o conflito e torná-lo suportável. E pode ter também uma função social: um heterossexual exprime seus preconceitos contra os gays para ganhar a aprovação dos outros e assim aumentar a confiança em si mesmo.

Nada melhor para ilustrar a homofobia e a hipocrisia da sociedade em que vivemos — na qual a maioria das pessoas defende os direitos humanos — do que a frase de Leonardo Matlovich, soldado da Força Aérea Americana condecorado por sua atuação na Guerra do Vietnã e expulso da corporação em 1975 por homossexualidade:
"A Força Aérea me condecorou por matar dois homens no Vietnã e me expulsou por amar um."

Por mais que se denuncie o absurdo que o ódio e a frequente agressão aos gays representam, a homofobia não deixará de existir num passe de mágica. Seu fim depende da queda dos valores patriarcais que, já em curso, vem trazendo nova reflexão sobre o amor e a sexualidade.

Caminhamos para uma sociedade de parceria, e se nela o desejo de adquirir poder sobre os outros não for preponderante, a homossexualidade deixará de ser tratada como anomalia, passando a ser aceita como tão normal e saudável quanto a heterossexualidade.

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Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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