"Meu pai, com um tom de voz autoritário, perguntou: Você é ou não é homem?"
"Minhas lembranças sobre a consciência da condição de homem não são as melhores, embora eu saiba que não estou só. Como filho único e com muitos primos, tive pouco contato com as meninas e quando tinha ficava tímido. Acho que eu estava com uns 12 ou 13 anos quando a filha de uma amiga de minha mãe, da minha faixa de idade, mas muito "descolada" me abraçou e eu me encolhi. Meu pai e dois primos, que estavam por perto, debocharam de mim. Lembro de ter ficado trêmulo. Meu pai se aproximou e, com um tom de voz autoritário, perguntou: 'Você é ou não é homem?'. E ordenou que eu correspondesse ao abraço. Todos riram de mim. Nunca vou esquecer o constrangimento que senti"
***
As sociedades patriarcais utilizam métodos variados para transformar um menino em "homem de verdade", mas essa identidade masculina é adquirida com grande esforço. A menstruação da menina, no início da adolescência, não deixa dúvidas de sua identidade feminina. Nesse momento ela passa de menina a mulher. No homem, ao contrário, um processo educativo deve substituir a natureza.
Pela atividade sexual que desempenha o homem toma consciência de sua identidade e virilidade. É considerado homem quando seu pênis fica ereto e "come" uma mulher. E isso deve acontecer o mais cedo possível. De maneira explícita ou não é pressionado pelos amigos ou pelo próprio pai, às vezes de forma patética.
Várias sociedades utilizam ritos de iniciação para que o menino se afaste do mundo das mulheres e renasça homem. Esses rituais comportam três etapas bastante dolorosas: a separação da mãe e do mundo feminino; a transferência para um mundo desconhecido; a passagem por provas dramáticas e públicas.
Quando tudo é concluído, o menino é considerado um homem. Em diferentes culturas e épocas observa-se a preocupação de que os filhos sejam contaminados pelas mães. Acreditam que se não forem afastados delas, não é possível se tornarem homens adultos. Geralmente o primeiro ato de iniciação masculina é arrancar o filho da mãe entre os 7 e os 10 anos.
Os sambia da Nova Guiné anunciam o começo da iniciação dos meninos pelo som das flautas. Eles são arrancados de suas mães e levados para a floresta onde durante três dias são chicoteados até sangrar para a pele se abrir, estimulando o crescimento. As surras são dadas com folha de urtiga e eles devem sangrar pelo nariz. Só assim acreditam poder se livrar dos líquidos femininos que os impedem de se desenvolver. Depois de separados, os meninos não podem mais falar, tocar ou mesmo olhar para suas mães até atingir plenamente o estado de homem, isto é, quando se tornarem pais.
No Ocidente, onde os rituais de iniciação não são claramente definidos, a masculinidade necessita ser provada durante toda a vida de um homem, sempre havendo o risco de se ver diminuído ao nível de condição feminina. Para corresponder ao ideal masculino da nossa cultura o homem tem que rejeitar uma parte de si mesmo, lutando para não se entregar à passividade e à fraqueza.
No momento atual, estamos em pleno processo de transformação no que diz respeito à valorização da virilidade. Já é possível sentir sinais do desprestígio do machão. O homem que fica triste e chora adquire um novo valor: o do homem sensível. No entanto, a mudança das mentalidades demora algumas vezes mais de cem anos para se concretizar, mas isso não importa, desde que se abra um espaço definitivo para a autonomia de homens e mulheres.
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