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Regina Navarro Lins

A experiência como ameaça

Regina Navarro Lins

14/04/2015 07h00

Ilustração: Lumi Mae

Ilustração: Lumi Mae

 

Comentando a Pergunta da Semana

A maioria das pessoas que responderam à enquete acredita que a mulher não deve esconder sua experiência sexual do futuro marido. Mas nem sempre isso é simples. Pensando no tema, lembrei-me de uma discussão entre meus alunos da faculdade.

A maioria deixava claro sua restrição em namorar moças que haviam tido várias experiências sexuais. Um dos rapazes, indignado com o conservadorismo da turma, pediu a palavra e fez um pequeno discurso em que se dizia liberal, sem preconceito algum.

E para demonstrar que na prática o que dizia era verdade, afirmou, sentindo-se superior aos colegas: "Eu não tenho o menor problema em namorar uma mulher que tenha tido outros parceiros antes de mim. Desde que no máximo três!"

Será que na realidade, se fosse possível, os homens não escolheriam ainda mulheres virgens para casar? É evidente que isso é cada vez menos valorizado, mas a liberdade sexual da mulher, pelo jeito, não chega a ser questão tão natural como muitos pensam.

Parece que ela não teve muita sorte ao receber de saída um hímen, que, ao indicar que sua vida sexual ainda não começou, aumenta os preconceitos e as restrições à sua sexualidade.

Por mais que as práticas adotadas em cada lugar sejam variadas, sempre a virgindade da mulher é mais importante do que a do homem e seu prazer muito mais controlado. O homem também é controlado, mas para deixar de ser virgem e transar com o maior número possível de mulheres. Numa sociedade patriarcal, todos cobram isso dele.

Na adolescência surge forte interesse sexual nos jovens. A moça é incentivada a ser bonita e atraente, mas recatada. Se quiser ser valorizada, deve ter sempre um ar de quem não se interessa muito por sexo. A repressão sexual de que todos somos vítimas estimula a culpa da menina pelo despertar da sexualidade.

São tantos os conselhos e proibições, tantos alertas em relação aos perigos envolvidos, tantas certezas exigidas, que ela se torna insegura e medrosa, sendo muito difícil desenvolver uma sexualidade saudável. Sem contar o temor de ser rotulada de "galinha" e, por isso, desvalorizada.

Durante muito tempo o controle da sexualidade feminina teve a intenção de impedir o sexo antes do casamento. Sexo e reprodução estavam intimamente ligados e havia no homem o pavor de assumir um filho que não fosse seu. Principalmente por causa da herança, claro.

Só depois da pílula, na década de 60, foi possível tomar conhecimento de que havia outros fatores, até então ocultos, alimentando esse controle. Os preconceitos fazem os jovens repetir, sem saber por quê, os valores que herdaram.

Quanto mais a mulher aceita que o prazer no sexo é natural e deve ser desenvolvido, mais o homem fica inseguro quanto a sua competência sexual. Isso faz com que prefira mulheres inexperientes para nunca ser comparado a outros homens.

Contudo, hoje, pelo menos nos grandes centros urbanos, a maioria dos homens aceita namorar e casar com moças que já tiveram diversas experiências anteriores. Mas não é uma evolução masculina espontânea. Com a emancipação feminina os homens se viram forçados a isso.

Sem dúvida, com todas as transformações que ocorrem no mundo, o homem que valoriza a mulher inexperiente não conseguiu ainda se libertar dos valores de uma sociedade autoritária.

Sua submissão o impede de enxergar o sexo como algo bom, natural, fazendo parte da vida, e encontrar na troca de prazer com sua parceira, independente da intensidade da sua vida sexual, uma fonte para seu desenvolvimento pessoal.

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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